Diretrizes mundiais da Organización Mundial de Gastroenterologia
Maio de 2021
Equipe de atualização das diretrizes
Peter Katelaris (Coordenador, Austrália)
Richard Hunt (Coordenador, Reino Unido)
Franco Bazzoli (Itália)
Henry Cohen (Uruguai)
Kwong Ming Fock (Singapura)
Manik Gemilyan (Arménia)
Peter Malfertheiner (Alemanha)
Francis Mégraud (França)
Alejandro Piscoya (Peru)
Duc Quach (Vietname)
Nimish Vakil (Estados Unidos)
Louis G. Vaz Coelho (Brasil)
Anton LeMair (Países Baixos)
(Clique para expandir secção)
A carga da doença recai desproporcionalmente sobre as populações com menos recursos. Como acontece com a maioria das doenças infecciosas, o maior impacto na redução dessa carga depende de melhorias nas condições socioeconômicas que interrompem a transmissão. Isso foi observado em muitas regiões do mundo, mas a prevalência da infecção permanece alta em muitas regiões onde essa melhoria nos padrões de vida é lenta.
Entretanto, o manejo clínico e as formas de tratamento ótimas permanecem inseguras e vão mudando com a alteração dos padrões de resistência antimicrobiana. Apesar de décadas de pesquisa e prática clínica, existem ainda grandes desafios. A busca da terapia mais eficaz, segura e simples ainda é um grande problema para os médicos. Uma vacina eficaz também parece ainda ser elusiva.
As diretrizes clínicas não raramente oferecem conselhos discordantes. É muito difícil para as diretrizes serem relevantes para diversas populações com espectros variados da doença, taxas de resistência microbiana e recursos muito diferentes. Como os fatores locais são essenciais para determinar o efeito e as estratégias de manejo da infecção por H. pylori, é importante que as diretrizes sejam baseadas no melhor conhecimento local disponível, em vez de meramente extrapolar a partir de diretrizes formuladas em outras regiões, que podem ser menos aplicáveis. Para este fim, esta revisão da diretriz WGO sobre H. pylori usa uma abordagem de “cascatas” que procura resumir os princípios de manejo e oferecer conselhos para diagnóstico e tratamento pragmáticos, pertinentes e realizáveis, com base nos princípios-chave de tratamento existentes e usando os conhecimentos e recursos disponíveis a nível local para orientar a prática regional.
A Helicobacter pylori foi reconhecida como um importante patógeno humano por quase quatro décadas. Contudo, apesar do impacto do tratamento dos indivíduos infectados e da reduzida transmissão da infecção nas comunidades onde o status socioeconômico melhorou, continua a ser o patógeno bacteriano humano mais comum, com talvez metade da população mundial infectada [1]. Como resultado, continua a ser uma das principais causas de morbimortalidade em todo o mundo.
A infecção por H. pylori causa invariavelmente gastrite crônica ativa. Na maioria das pessoas, a infecção pode permanecer clinicamente silenciosa ao longo da vida, mas em uma minoria significativa ela causa doenças gastroduodenais, particularmente úlcera péptica, câncer gástrico não cardíaco e linfoma de tecido linfoide associado à mucosa gástrica (MALT). Também aumenta o risco de ulceração e hemorragia gastroduodenal em pacientes que recebem anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), como a aspirina, e é responsável dos sintomas em um subgrupo de pacientes com dispepsia funcional.
A H. pylori tem sido estudada intensivamente. Uma pesquisa bibliográfica revela mais de 45.000 publicações. Muito se aprendeu sobre a epidemiologia da infecção, sua biologia, genética e fisiopatologia, expressão da doença, diagnóstico e tratamento. Mesmo assim, continuam a existir grandes lacunas no nosso conhecimento. Apesar de vários estudos epidemiológicos identificando fatores de risco de infecção, o modo exato de transmissão permanece pouco claro. Os determinantes da expressão da doença não estão ainda totalmente elucidados, incluindo muitos aspectos da interação hospedeiro-patógeno A fisiopatologia dessa interação é complexa e foi descrita em detalhe em outros lugares. [2,3]. As formas ideais de manejo clínico em diferentes contextos são ainda debatidas e prosseguem as tentativas de aperfeiçoar as modalidades diagnósticas. A busca do tratamento mais eficaz, seguro e simples ainda é importante para os médicos, e o problema da resistência antimicrobiana constitui um difícil desafio. O melhor método de vigilância das alterações histológicas adversas na mucosa gástrica ainda não foi determinado, e a busca de uma vacina eficaz está em curso.
Tem havido muitas revisões e diretrizes clínica sobre a H. pylori [4-12–12]. Como todo muda rapidamente, esses documentos de posição precisam de atualização e revisão periódicas. Além disso, é muito difícil para as diretrizes serem relevantes para populações tão diversas com diferentes espectros da doença e cujos recursos muitas vezes diferem amplamente. Não é raro que as diretrizes deem conselhos discordantes. Como os fatores locais são centrais para determinar o impacto e as estratégias de manejo da infecção por H. pylori, isto não é surpreendente. É importante que o aconselhamento clínico se baseie nas melhores informações locais disponíveis, em vez de ser extrapolado a partir de diretrizes formuladas em outras regiões, que podem ser menos aplicáveis. No entanto, em muitas das áreas onde H. pylori tem o maior impacto, faltam dados de alta qualidade para determinar a melhor prática local. Essa falta de conhecimento representa um desafio significativo. Entretanto, as decisões devem ser baseadas nas melhores evidências locais disponíveis, na extrapolação de dados de maior qualidade de outros lugares e na opinião de especialistas.
O objetivo desta atualização da diretriz da WGO é resumir e rever a evidência de várias novas diretrizes que resumem as melhores práticas e sugerir como esses princípios podem ser aplicados em todo o mundo usando a abordagem “cascatas”. Esta abordagem reconhece as variações na prevalência e impacto regionais da infecção e as grandes diferenças nos recursos de saúde disponíveis para enfrentar o problema, uma vez que abordagens locais pragmáticas e adaptadas são necessárias. A carga da doença causada por H. pylori recai desproporcionalmente sobre as regiões com menos recursos, que são subrepresentadas nos levantamentos epidemiológicos e muitas vezes negligenciadas nas diretrizes clínicas.
Declaração-chave
É muito difícil tornar relevantes as diretrizes para uma ampla gama de populações com diversos espectros da doença e com recursos terapêuticos muito diferentes.
A infecção por H. pylori persiste geralmente por toda a vida, a menos que seja tratada com antibióticos ou auto-erradicada quando uma infecção de longa data causa atrofia e metaplasia generalizada da mucosa gástrica com acloridria. Uma infecção transitória pode ocorrer em alguns lactentes. Em adultos que foram tratados, a reinfecção é rara nas regiões de maior e menor prevalência. A reinfecção pode ser confundida com recrudescência quando a infecção é suprimida transitoriamente, abaixo do limiar de detecção por testes, mas não foi erradicada pelos antibióticos. Existem variações na virulência de diferentes estirpes de H. pylori a nível mundial. A interação entre o hospedeiro e os fatores ambientais pode determinar diferenças na expressão da doença.
Embora existam fatores de risco de infecção bem descritos e hipóteses plausíveis, o modo exato de transmissão ainda não foi estabelecido definitivamente. A maioria das infecções parece ocorrer na primeira infância e uma minoria dos casos ocorre em adultos. Os estudos epidemiológicos e genéticos mostram fortes evidências a favor da transmissão de pessoa para pessoa, especialmente no seio familiar. As mães parecem ser especialmente importantes na transmissão aos filhos pequenos. A via mais plausível de ingestão do microrganismo parece ser gastro-oral ou oral-oral. A transmissão fecal-oral parece menos provável, pelo menos nos países desenvolvidos. Se a transmissão ocorre através da água, comida, animais domésticos ou moscas é ainda uma questão de especulação.
Embora se pense que metade da população mundial esteja infectada com H. pylori, existe uma grande variação na prevalência da infecção, entre e dentro dos países (Fig. 1). Além disso, a prevalência pode variar dentro da mesma cidade e também entre subgrupos de uma população (Fig. 2) [13]. Assim, pode haver grandes variações na prevalência entre as populações urbanas mais ricas e as rurais.
A qualidade dos dados de prevalência varia. Muitos estudos não são de prevalência verdadeiros, mas sim auditorias de subconjuntos clínicos. Outros estudos podem não representar um corte transversal válido da população. Também existe uma variabilidade significativa na qualidade dos relatos. Em algumas regiões, os métodos de diagnóstico podem ser menos confiáveis, enquanto alguns países são mal representados devido à falta de informação fiável. Por todo isso, uma única figura não pode resumir e representar a prevalência da infecção em todo um país e deve ser aplicada com cautela. Por exemplo, um estudo de prevalência de uma cidade em uma região de um país populoso e multiétnico com grande variação nos níveis socioeconômicos é pouco provável que represente a verdadeira prevalência em todo o país e não pode refletir subconjuntos de alto e baixo risco. No entanto, países e regiões geralmente podem ser caracterizados como locais de alta, média e baixa prevalência [1].
O principal determinante da prevalência da infecção é o nível socioeconômico na infância. Os fatores socioeconômicos refletem os níveis de higiene, saneamento, densidade populacional e nível de educação.
Uma forte relação inversa foi sistematicamente descrita. Assim, como esperado, a prevalência da infecção é geralmente maior nos países em desenvolvimento, e a infecção é quase onipresente em alguns dos subconjuntos mais pobres dessas populações. Os imigrantes dessas regiões são reconhecidos como grupo de alto risco nos países mais desenvolvidos e de baixa prevalência,
Declaração-chave
O principal fator determinante da prevalência da infecção é o nível socioeconômico na infância.
A prevalência da infecção por H. pylori aumenta com a idade. Isso se deve sobretudo ao efeito de coorte, no qual o risco de adquirir a infecção foi maior na infância daqueles nascidos há mais tempo em comparação com os mais recentes, e não por refletir a aquisição contínua na idade adulta. A etnia tem sido descrita como fator de risco; mas, é provável que esteja intimamente relacionada com o status socioeconômico ou práticas compartilhadas que podem aumentar o risco de transmissão, em vez de ter base genética.
Uma observação surpreendente foi a mudança na prevalência da infecção ao longo do tempo em alguns países. Relatos de taxas de infecção em queda rápida, mais acentuadas nas crianças e adultos jovens, são frequentes em países desenvolvidos e em países que tiveram um rápido desenvolvimento econômico que levou a um aumento do nível socioeconômico. Nesses países, a prevalência da infecção é atualmente baixa.
Essa observação permite prever uma diminuição gradual na prevalência da úlcera péptica e do câncer gástrico não cárdia, uma vez que, em geral, a prevalência da úlcera péptica e do câncer gástrico reflete a prevalência de H. pylori em uma população. De fato, a prevalência de úlcera e câncer gástrico diminuiu durante décadas nos países desenvolvidos. A diminuição da expressão da doença está atrasada em relação ao declínio das taxas de infecção. A diminuição da prevalência da infecção e da doença ocorreu muito antes do reconhecimento da H. pylori e do desenvolvimento dos tratamentos.
Tal como acontece com a maioria das doenças infecciosas endêmicas, o declínio da prevalência tem mais a ver com melhorias na higiene e saneamento da população do que com tratamentos individuais, caso a caso, uma vez que na maioria dos países, apenas uma minoria de indivíduos infectados recebe terapia. Exceções notáveis são os países com muitos recursos e alta prevalência, como o Japão, onde a triagem e o tratamento são agora feitos sistematicamente no início da idade adulta. A prevalência da infecção parece ser estável em países onde os padrões não melhoraram ou pioraram, e é pouco provável que diminua substancialmente antes de ocorrer uma melhora. A úlcera péptica continua disseminada em muitos desses países. A carga do câncer gástrico recai também desproporcionalmente nessas populações.
Declaração-chave
Tal como acontece com a maioria das doenças infecciosas endêmicas, um declínio na prevalência tem mais a ver com melhorias na higiene e saneamento da população do que com tratamento individual, caso a caso, uma vez que, na maioria dos países, apenas uma minoria de indivíduos infectados recebe tratamento.
O reconhecimento de que a H. pylori era a causa da maioria das úlceras duodenais e de cerca de dois terços das úlceras gástricas foi um grande avanço médico, vencedor de um Prêmio Nobel [14]. Em muitos países desenvolvidos, com uma prevalência decrescente de infecção e cura de doentes com úlceras, a proporção de todas as úlceras pépticas devidas à H. pylori está diminuindo. Nos países menos desenvolvidos, onde a prevalência da infecção permanece alta e menos pacientes com úlcera recebem tratamento curativo, a úlcera péptica (UP) continua a ser uma condição muito comum e importante. Estima-se que a infecção por H. pylori confere um risco individual de úlcera péptica de 15-20% ao longo da vida. Não tratada, a UP é uma doença crônica remitente-recorrente que causa mortalidade e morbidade significativas por dor, sangramento e perfurações, além de causar prejuízos financeiros. A erradicação da H. pylori cura a maioria das úlceras pépticas ativas e evita novas recidivas, alcançando assim a cura. A erradicação da H. pylori em pacientes com histórico de úlcera evita as recidivas subsequentes.
AINEs e aspirina causam a maioria das outras úlceras pépticas. H. pylori e AINEs funcionam sinergicamente aumentando o risco de úlceras e hemorragias. A erradicação da H. pylori reduz este risco antes do início da terapia crônica com AINEs.
Em hospedeiros infectados suscetíveis, a gastrite crônica ativa de longa data pode causar atrofia da mucosa gástrica com metaplasia intestinal. Em uma minoria, essas alterações pré-malignas da mucosa progridem para displasia, depois para câncer inicial clinicamente silencioso e, finalmente, para câncer gástrico avançado. O câncer gástrico geralmente se apresenta em fase avançada e sintomática e tem um prognóstico geralmente pouco favorável. Foi estimado que H. pylori confere um risco individual de câncer gástrico vitalício de 1,5-2,0% em indivíduos infectados. Apesar do risco individual relativamente baixo, uma vez que existem bilhões de pessoas infectadas em todo o mundo, existe uma carga global de câncer gástrico superior a um milhão por ano, com uma alta taxa de mortalidade (Tabela 1) [15]. Esta carga não é distribuída de forma uniforme. A Ásia Oriental - Japão, Coréia e leste da China - tem a maior prevalência da doença. A China sofre de 40% dos casos mundiais de câncer gástrico. A maioria dos cânceres gástricos, mas não todos, estão relacionados com a H. pylori. O risco de progressão para câncer gástrico varia e está relacionado a fatores do hospedeiro e do patógeno. Os cofatores hospedeiros incluem tabagismo e dieta. Alta ingestão de sal, consumo de vinagrete ou alimentos em conserva e dietas baixas em antioxidantes são cofatores alimentares. Fatores de risco genéticos no hospedeiro associados ao aumento do risco incluem a presença de polimorfismos nos genes que determinam a expressão de interleucina-1 (IL-1; citocinas pró-inflamatórias) e receptores de reconhecimento de patógenos. O estudo genotípico de cepas de H. pylori revelou diferenças nos fatores de virulência que promovem a inflamação e que estão associados a um risco aumentado de câncer.
A erradicação da H. pylori antes de haver alterações histológicas pré-cancerosas adversas demonstrou prevenir o câncer gástrico e justifica os programas massivos de triagem e tratamento em adultos jovens em países com alta carga de doença e recursos suficientes. Em regiões com menos recursos e alto índice de câncer gástrico, essa estratégia continua a ser uma aspiração e não uma possibilidade, dadas as restrições orçamentárias, dificuldades logísticas e outras necessidades de saúde.
A erradicação da H. pylori após o início da atrofia da mucosa e/ou metaplasia intestinal pode reduzir o risco de câncer gástrico, mas não o elimina [16]. Em qualquer indivíduo, o risco residual está relacionado com a extensão e gravidade das alterações da mucosa, bem como a outros fatores de risco do hospedeiro. A vigilância endoscópica da metaplasia intestinal pode ser apropriada em alguns contextos.
O linfoma do tecido linfoide associado à mucosa gástrica (MALT) é raro. A maioria dos casos é resultado de infecção por H. pylori, e a erradicação dessa bactéria, quando o linfoma está em fase de baixo grau, resulta em regressão e cura. Recidivas ocasionais tardias após a erradicação foram descritas.
Declaração-chave
A erradicação da H. pylori antes de ocorrer alterações histológicas adversas e pré-cancerosas previne o câncer gástrico e justifica os programas massivos de triagem e tratamento em adultos jovens em países com alta carga da doença e recursos suficientes para essa tarefa.
A maioria das gastrites por H. pylori é assintomática, mas está normalmente associada a sintomas de intestino grosso na ausência de úlcera. Contudo, apenas um terço ou menos dos pacientes infectados com “dispepsia funcional” obtêm alívio sustentado dos sintomas após a terapia de erradicação. Isto porque a dispepsia funcional é uma condição heterogênea que pode ser decorrente de diferentes mecanismos. H. pylori pode ser causal em alguns pacientes sintomáticos e pode estar presente acidentalmente em outros. No entanto, a proporção de pacientes infectados que melhoram após a terapia de erradicação é maior do que aqueles que recebem terapia empírica com supressão ácida. Além disso, os pacientes podem beneficiar de um risco reduzido de úlcera e câncer ao longo da vida, especialmente se forem tratados antes do aparecimento de alterações histológicas adversas na mucosa gástrica.
Uma classificação recentemente revisada Dispepsia associada à H. pylori da gastrite reconheceu a dispepsia associada à H. pylori como uma entidade claramente definida e foi incorporada à 11ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11) [11]. A classificação também ressalta a importância da gastrite por H. pylori como lesão precursora que causa úlcera péptica e câncer gástrico, independentemente da presença de sintomas.
A infecção por H. pylori foi associada a várias outras condições. Na maioria dos casos, a associação não demonstrou ser causal e as comorbidades vão coexistir inevitavelmente em alguns pacientes. Existem evidências modestas que relacionam a H. pylori à púrpura trombocitopênica imune e a terapia de erradicação foi tentada com resultados variáveis.
A decisão de tratar ou não a H. pylori deve ser uma decisão ativa que leve em consideração as circunstâncias e riscos individuais do paciente. Portanto, a decisão de fazer o teste para H. pylori só deve ser tomada com intenção terapêutica.
Boas práticas
A decisão de testar a H. pylori só deve ser tomada com intenção terapêutica.
As indicações baseadas em evidências para testar e tratar a H. pylori estão resumidas na Tabela 2 [4,17]. A aplicabilidade de cada indicação em diferentes regiões dependerá da prevalência da infecção e da doença, dos recursos, da coexistência de outras necessidades concorrentes de recursos e dos fatores individuais de cada paciente. A úlcera péptica é a principal indicação na maior parte do planeta. Os benefícios clínicos e de saúde da terapia curativa de curto prazo para uma doença frequente, crônica e importante foram amplamente demonstrados ao longo de muitos anos. Nas regiões com poucos recursos, esta indicação terapêutica deve ser uma prioridade.
Os testes de diagnóstico para H. pylori podem ser invasivos (endoscópicos) ou não invasivos (não endoscópicos) (Tabela 3). As biópsias feitas em endoscopia são geralmente usadas para análise histológica e teste de urease. As biópsias para cultura são menos utilizadas para diagnóstico, a menos que estejam disponíveis testes de resistência bacteriana e sejam necessários para ajudar na tomada de decisões clínicas individuais ou para determinar as taxas de resistência na população. Uma combinação de duas modalidades de teste retiradas de duas localizações topográficas no estômago é geralmente mais eficaz para o diagnóstico. Na prática, isto geralmente significa o envio de biópsias do antro e do corpo do estômago para histologia e do antro para teste de urease. Protocolos de biópsia mais estruturados podem ser usados quando existe uma também necessidade de vigilância histológica, como nos Operative Link on Gastritis Assessment (OLGA) e Operative Link on Gastritis/Intestinal-Metaplasia Assessment (OLGIM) [18]. A histologia costuma ser cara, muito dependente do operador e não pode ser considerada exata, exceto em comparação com outras modalidades de teste anteriores.
Em regiões com recursos limitados, o teste de urease é comum. A maioria dos testes comerciais de urease parecem ter uma sensibilidade de cerca de 95%. Embora muito mais baratos do que a histologia, esses testes ainda podem representar uma carga significativa de custos em regiões com poucos recursos, especialmente quando o custo é suportado pelo paciente. Um teste comercial geralmente custa US$ 5. Em regiões onde a renda média diária de um trabalhador não qualificado é de US$ 1-2, isto pode não ser acessível. Felizmente, existem testes genéricos de urease muito econômicos disponíveis há muitos anos e podem ser feitos in situ, a cerca de 20 centavos por unidade. Estes são geralmente testes não tamponados de resultado muito rápido e com sensibilidade muito semelhante à dos testes comerciais [19]. São usados em países da África, Ásia e região do Pacífico.
A cultura de H. pylori a partir de biópsias requer condições específicas de transporte, técnicas de laboratório e equipamento. As taxas de sucesso da cultura podem chegar a 90% em centros bem treinados, mas são geralmente inferiores em centros menos treinados. A subcultura para testes antimicrobianos pode nem sempre ser bem-sucedida nos laboratórios menos especializados, portanto, nem sempre é possível obter resultados quando necessário. Existem testes comerciais de reação em cadeia da polimerase (PCR) em tempo real que permitem a detecção de H. pylori com altos níveis de sensibilidade e especificidade; e de mutações que causam resistência à claritromicina [20-22–22]. Esse teste não precisa condições pré-analíticas rigorosas e pode ser feito em poucas horas. A validação e aplicação dos testes rápidos e baratos de resistência antimicrobiana no local de atendimento prometem ser um grande avanço no manejo desses pacientes. A disponibilidade desse teste em regiões de alta resistência pode ajudar na escolha da terapia para pacientes individuais e facilitar as pesquisas de prevalência populacional.
Boas prática
A validação e aplicação de testes de PCR rápidos e baratos para diagnóstico e resistência antimicrobiana prometem ser um grande avanço no manejo desses pacientes.
O diagnóstico endoscópico da úlcera duodenal em região de alta prevalência e recursos limitados, em paciente que não recebe AINE, tem precisão de 95% na predição da presença da H. pylori. Embora seja desejável fazer uma biópsia para confirmar a infecção, a mera presença da úlcera duodenal tem um valor preditivo semelhante ao da maioria dos testes, por isso é razoável tratar o paciente sem incorrer em despesas adicionais (salvo se existirem testes de urease genéricos baratos).
Quando a endoscopia não for necessária ou não estiver disponível, podem ser utilizados testes não invasivos. Os testes respiratórios com ureia (TR) são muito úteis e têm maior precisão diagnóstica do que outros testes não invasivos para identificar a H. pylori (em pacientes sem história de gastrectomia). Surpreendentemente, esses testes não estão amplamente disponíveis em muitos países com grande frequência de H. pylori e úlcera péptica. As razões são complexas e podem incluir a falta de especialização ou de recursos para instalar e operar laboratórios que façam TRs, o custo relativamente elevado dos kits de testes comerciais, ou a dependência excessiva da terapia empírica ou da endoscopia. Em muitos casos, a ansiedade válida para o câncer gástrico é um fator importante para o uso da endoscopia (embora, uma vez sintomáticos, os cânceres gástricos raramente sejam curáveis). Os custos do TR variam. Em países com maiores recursos, eles se comparam muito favoravelmente com os da endoscopia, embora em regiões onde a endoscopia é relativamente barata, a vantagem dos custos desapareça a menos que TRs de baixo custo estejam disponíveis. O teste respiratório com ureia marcado com isótopo estável C13 foi validado em detalhe em muitos lugares, e é geralmente preferido em regiões com bons recursos. O TR-C14 usa uma dose muito baixa de isótopo radioativo e tem normalmente um tempo de coleta mais curto, mas não foi amplamente validado. Pode ser um pouco menos exato. Os custos de instalação do laboratório para TR-C13 são mais elevados, pois é necessário um espectrômetro de massa, enquanto para o TR-C14 é preciso um detector de cintilação menos caro. O custo unitário real (não comercial) do isótopo C14 é baixo, portanto, o teste poderia ser fornecido a um custo muito baixo utilizando um modelo de laboratório central “hub and spoke” para prestação de serviços, com amostras de respiração coletadas remotamente a serem entregues de uma região para outra. Existem kits e analisadores comerciais para o ponto de atendimento. A precisão varia e o custo unitário desses kits costuma ser alto.
O teste de antígeno fecal é outra opção. Esses testes parecem ser quase tão exatos quanto os TRs, mas os pacientes e os profissionais da saúde e laboratórios têm uma preferência menor por testes baseados nas fezes. Em alguns lugares, o custo é um problema. Testes rápidos de PCR fecal também estão disponíveis [21]. Embora esses testes enfrentem as mesmas barreiras de aceitação, além de exigirem equipamentos e técnicas laboratoriais, eles oferecem a possibilidade de diagnóstico rápido e testes de resistência antimicrobiana em um único teste não invasivo.
Os testes sorológicos de anticorpos estão normalmente disponíveis. Embora úteis para inquéritos soroepidemiológicos, esses testes carecem muitas vezes da sensibilidade e especificidade necessárias para tomar decisões com cada paciente individual e não são geralmente muito úteis. Eles precisam ser validados para locais específicos, e o problema dos resultados falsos devido à reatividade cruzada raramente foi abordado. Em uma comunidade com prevalência moderada de H. pylori, a exatidão desses testes não pode exceder 50%.
Como o sucesso da erradicação é muito variável, o ideal é avaliar os resultados em todos os pacientes, embora isso possa não ser universalmente viável. Deve ser dada prioridade àqueles que permanecem em maior risco de danos se a infecção persistir, como àqueles que recebem tratamento por doença ulcerosa complicada (hemorragia ou perfuração).
O teste de biópsia pode ser utilizado para determinar o resultado após a terapia de erradicação quando a endoscopia for necessária (para avaliar a cicatrização da úlcera gástrica e excluir neoplasia, ou para examinar histologia adversa, por exemplo). Caso contrário, são preferidos os testes não invasivos. Os testes TRs e fecais devem ser feitos pelo menos um mês após o fim da terapia de erradicação. Para minimizar os resultados falso-negativos, não devem ser tomados antibióticos ou compostos de bismuto durante pelo menos um mês antes do teste, e o uso de inibidores da bomba de prótons (IBP) deve ser evitado durante pelo menos uma, de preferência duas semanas. A sorologia não é útil para avaliar o resultado, uma vez que os níveis de anticorpos tendem a persistir anos após o tratamento. Apesar da validação generalizada dos testes diagnósticos não invasivos, e dos testes respiratórios em particular, ainda não estão disponíveis a baixo custo em muitas partes do mundo, o que constitui uma importante necessidade clínica não coberta.
A escolha do teste diagnóstico depende muito do contexto clínico, disponibilidade, experiência e custo. Se todas as modalidades de diagnóstico estiverem disponíveis, a questão principal seria se é necessária a endoscopia para investigar os sintomas ou sinais da doença intestinal superior. Nos países mais desenvolvidos e com baixa prevalência, a avaliação da doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), dispepsia funcional, câncer do esôfago e cárdias são indicações frequentes para endoscopia, e é habitual fazer uma biópsia gástrica para detectar H. pylori. A H. pylori continua a ser um problema nessas regiões, sobretudo nos subgrupos de alto risco, como idosos e pessoas de menor nível socioeconômico ou imigrantes de regiões de alta prevalência. Nesses países, a estratégia não invasiva de “testar e tratar” com TR foi validada em pacientes jovens, mostrando ser custo-efetiva, embora seu uso possa estar diminuindo. Em vez disso, um ensaio empírico da terapia com IBP é normalmente feito na atenção primária, como recurso à endoscopia se os sintomas não forem aliviados. Embora popular, esta estratégia é problemática quando os sintomas não são típicos da DRGE e a duração ideal da referida terapia não fica clara. Pode levar ao fracasso do diagnóstico de H. pylori. Ainda que a apresentação do microrganismo seja fortuita, o tratamento em adultos jovens está associado a uma redução significativa do risco a longo prazo. A relação custo-eficácia das estratégias de manejo da H. pylori em países com bons recursos e baixa prevalência varia em função dos custos locais de cuidados da saúde.
Nos países com maior prevalência, tanto o médico quanto o paciente preferem claramente uma endoscopia imediata, por medo do câncer gástrico -embora, como referido, não seja seguro que isto melhore a sobrevivência quando os pacientes apresentam sintomas. Para a tomada de decisões individuais, a probabilidade de infecção pré-teste, a idade do paciente, a natureza dos sintomas ou sinais e a prevalência local de úlcera e câncer gástrico devem ser considerados.
Quando o acesso aos meios endoscópicos ou não invasivos para diagnosticar a infecção por H. pylori é muito limitado, as decisões devem ser tomadas empiricamente, considerando as instalações clínicas. Pode haver uma forte suspeita de úlcera péptica clínica quando há uma história clara de dor abdominal alta persistente e/ou uma história de hemorragia gastrointestinal alta no passado ou mais recente. Em regiões onde a prevalência de H. pylori é conhecida como alta e a úlcera péptica é comum, é razoável utilizar a terapia empírica de erradicação para um diagnóstico clínico presuntivo de úlcera péptica (Fig. 3). A coorte assim tratada inclui muitas pessoas com úlceras pépticas que vão obter grandes benefícios. Também irá incluir alguns com gastrite associada a H. pylori, mas nenhuma úlcera ativa. Neste grupo, a resolução dos sintomas ocorre com mais frequência do que com qualquer outra terapia (geralmente IBP) e, o mais importante, uma terapia bem-sucedida reduz o risco de úlcera péptica e câncer gástrico ao longo da vida. O tratamento tanto da úlcera péptica como da gastrite tem demonstrado ser rentável.
Com a terapia de erradicação baseada em sintomas empíricos, haverá um subgrupo não infectado e que pode ter outras patologias. Este grupo não beneficiará da terapia de erradicação cara que envolve o uso desnecessário de antibióticos, mas a probabilidade de grandes danos é baixa e o benefício geral para o grupo tratado justifica essa abordagem. De fato, o Grupo de Consenso Ásia-Pacífico sobre H. pylori aprovou especificamente tal abordagem em regiões com alta frequência de H. pylori e úlcera péptica e muitas pessoas não têm acesso a estudos diagnósticos por razões econômicas ou geográficas. O uso empírico do IBP é provavelmente menos benéfico do que a terapia inicial. Tal abordagem deve ser apoiada por programas de formação para profissionais da saúde, para aprender a reconhecer os sintomas mais sugestivos de úlcera e aplicar essa estratégia de forma seletiva. Nessas regiões com poucos recursos, é mais difícil justificar o tratamento de todos os sintomas do aparelho digestivo superior com esse tipo de abordagem.
O uso de AINEs é muito comum, e a úlcera péptica associada a AINE é frequente e pode coexistir com a infecção por H. pylori. Em um cenário empírico de suspeita de úlcera, quando se utiliza AINE (incluindo aspirina), é razoável tratar a H. pylori e abordar o risco dos AINEs interrompendo o uso desses agentes e tratando o paciente com IBP durante algumas semanas após terminar o tratamento de erradicação.
Em regiões com poucos recursos e alta prevalência, onde não existem testes diagnósticos disponíveis, um quadro que sugere úlcera crônica - dor abdominal alta periódica e/ou melena passada ou presente - sugere uma alta probabilidade de H. pylori e justifica a terapia empírica de erradicação, especialmente em pacientes sem história de uso de AINE ou aspirina.
Muitos estudos abordaram questões terapêuticas e existem inúmeras diretrizes de especialistas recomendando diferentes opções de tratamento. No entanto, grande parte da literatura e conselhos provêm de países com bons recursos, e relativamente pouca provém de países com poucos recursos que suportam a maior carga de doenças causadas por H. pylori. Foram estabelecidos princípios para a terapia com antibióticos universalmente aplicáveis. Contudo, existem questões-chave que devem ser abordadas localmente para determinar as melhores práticas locais, uma vez que os padrões de resistência antimicrobiana, e portanto, as taxas de erradicação variam regionalmente [23,24]. Outras questões locais, como custo e disponibilidade dos medicamentos influenciam a escolha do tratamento. Os princípios-chave que orientam a escolha da terapia de erradicação são descritos na Tabela 4.
A aplicação desses princípios terapêuticos irá garantir os melhores resultados possíveis. Em regiões com bons recursos, a terapia pode se basear em testes de alta qualidade e dados de auditorias e culturas; em regiões com poucos recursos, a confiança no conhecimento do uso comunitário ou pessoal de antibióticos e uma auditoria local dos resultados irá influenciar o uso de terapias recomendadas em outras diretrizes [4-12].
Em muitas partes do mundo, a terapia tripla, que compreende um inibidor da bomba de prótons (IBP) com amoxicilina e claritromicina (IBP-AC), continua a ser o tratamento de primeira linha mais utilizado. Esta combinação foi a primeira terapia amplamente recomendada e substituiu as terapias triplas menos eficazes. Foi muito bem avaliada ao longo dos anos. O principal fator determinante do sucesso da erradicação com esta combinação é a resistência à claritromicina (RC) antes do tratamento. A prevalência da resistência antimicrobiana, particularmente RC, varia muito em todo o mundo (Tabela 5). Onde a claritromicina tem sido e é comumente utilizada como monoterapia para outras infecções, o nível de RC costuma ser alto e crescente. Há quem considere que essa terapia deve ser abandonada em áreas onde as taxas de RC primária são de 15-20% ou superiores, devido ao impacto que isso tem nas taxas de erradicação. Uma taxa mínima arbitrária de erradicação de 80% com base na intenção de tratamento é frequentemente citada como referencial para uma terapia aceitável. Esta é uma taxa de erradicação comum para IBP-AC em estudos do mundo real em áreas onde as taxas de RC são moderadas ou baixas (ou seja, abaixo de 15-20%). Em países onde a prevalência de RC é mais alta, os resultados da erradicação podem ser incrivelmente baixos.
O principal determinante do sucesso da erradicação com IBP-AC é a resistência à claritromicina antes do tratamento.
A duração ideal da terapia é controversa. Apelos recentes para terapia universal de 14 dias com IBP-AC têm origem em regiões com maior RC. Os estudos iniciais foram, na maioria, de 7 dias, embora essa duração possa ter sido influenciada pelo desenho dos ensaios de registro. Os defensores da terapia mais prolongada indicam as taxas de erradicação um pouco mais altas descritas nas revisões sistemáticas. Contudo, existem outras considerações que influenciam a duração da terapia, especialmente em países com poucos recursos. Adicionar uma segunda semana de terapia pode aumentar as taxas de erradicação, normalmente em 10%. Isso significa que o número de pacientes necessários para tratar com uma semana extra de terapia, para conseguir mais um sucesso de tratamento, é de 10. O preço deste aumento na taxa de erradicação, se alcançado, inclui duplicar o custo do tratamento, o que constitui um problema importante nas regiões com poucos recursos. (Observe que o custo de uma semana de terapia tripla em regiões com poucos recursos pode equivaler à renda semanal dos indivíduos de baixa renda.) O uso prolongado de antibióticos aumenta muito o risco de efeitos adversos, tal como a probabilidade de inadimplência. Uma alternativa é dar uma terapia mais curta, o que irá melhorar talvez a adesão e reduzir os efeitos adversos e os custos, entendendo que 10% mais de pacientes podem precisar de terapia de resgate de segunda linha. O uso generalizado de antibióticos será muito menor com a segunda estratégia, desde que as taxas de erradicação da primeira linha sejam pelo menos moderadamente altas. A terapia mais longa é geralmente recomendada em alguns países com bons recursos, mas é necessária uma modelagem de cursos mais curtos nas regiões com poucos recursos. Importa também notar que as taxas aceitáveis de erradicação com terapia IBP-AC de 1 semana foram relatadas por vários países, e o benefício incremental de um curso mais longo não foi analisado. A dose ideal de IBP (dose padrão ou alta) e claritromicina (250 mg ou 500 mg duas vezes ao dia) não foi determinada na maioria dos lugares. Em regiões com alta RC, nem uma nem duas semanas desta terapia podem alcançar taxas de erradicação aceitáveis. Nessas situações, a escolha da terapia de primeira linha varia.
O papel e o valor dos bloqueadores de ácido competitivos do potássio (BAC-P), como o vonoprazan, em vez dos IBPs nas terapias de erradicação foram avaliados. Esses fármacos não são afetados pelos polimorfismos do CYP2C19 e causam uma inibição mais uniforme e potente da secreção de ácido gástrico [25].
A outra opção importante para o tratamento de primeira linha, em particular em regiões com alta RC primária, continua a ser a terapia quádrupla com bismuto. O regime mais estudado inclui IBP, bismuto, tetraciclina e metronidazol (IBP-BTM). Este tratamento resistiu ao teste do tempo, alcançando taxas de erradicação confiáveis e aceitáveis, independentemente da resistência primária ao metronidazol (RM), uma vez que a adição de IBP ao BTM parece ajudar a superar a RM. Foram obtidos bons resultados com a terapia de 7 dias, embora existam defensores de terapias mais longas (10-14 dias). As principais desvantagens desta terapia são a incomodidade do regime de doses (por ser geralmente administrada quatro vezes ao dia) e os efeitos adversos frequentes, mas leves, que podem prejudicar a adesão. As dificuldades em obter bismuto e tetraciclina podem limitar o uso dessa terapia em alguns lugares. No entanto, quando esses medicamentos não estão disponíveis ou registrados, muitas vezes é possível importar genéricos a baixo custo, com licença das autoridades competentes.
Uma terapia quádrupla que substitui a amoxicilina pela tetraciclina (IBP-BAM), foi descrita há bastante tempo; embora menos utilizada, pode alcançar resultados aceitáveis.
Mais recentemente, foi descrita a conversão da terapia tripla IBP-AC padrão para terapia quádrupla por adição de bismuto (B+ IBP-AC), com resultados favoráveis em alguns lugares [26]. O valor disto na superação da RC ainda não foi determinado plenamente, mas merece uma avaliação detalhada.
Existem defensores das terapias quádruplas sem bismuto -o que significa, normalmente, a adição de metronidazol à terapia tripla com IBP-AC (IBP-ACM). Isto pode aumentar as taxas de erradicação se as taxas de RM forem baixas ou moderadas, mas é pouco provável sua utilidade em muitas regiões do mundo com alta resistência primária ao metronidazol (RM) e/ou claritromicina (RC). Além disso, é frequente os pacientes com falha do tratamento apresentarem dupla resistência. Este tipo de terapia concomitante foi estudado em países ricos em recursos, mas raramente em países com poucos recursos. Os regimes sequenciais ou híbridos são menos estudados; não parecem melhorar a erradicação; sua administração é incômoda e apresentam problemas de adesão específicos. Como resultado, não são recomendados.
Quando a sensibilidade do paciente ao metronidazol é conhecida por ter sido testado, o IPB-AM pode ser utilizado como tratamento de primeira linha com resultados razoáveis. Também é adequado para populações onde a RM é conhecida por ser baixa.
A terapia tripla com levofloxacino (IBP, amoxicilina e levofloxacino: IBP-AL por 10-14 dias) tem sido utilizada na terapia de primeira linha quando a resistência ao levofloxacino (RL) é conhecida ou presumivelmente baixa, mas a combinação não foi amplamente estudada nesse papel, e a maioria dos relatos a menciona como terapia de segunda linha. Relatos de altas taxas de resistência ao levofloxacino em alguns países limitam a utilidade dessa terapia nesses lugares. O tratamento é geralmente bem tolerado. Recentemente, surgiram preocupações sobre os riscos do uso de fluoroquinolonas. Com o levofloxacino, isto está relacionado com o raro risco de tendinite ou miosite. A prevalência exata desse efeito adverso não está bem documentada, mas parece mais comum nos idosos e naqueles com artrite inflamatória ou insuficiência renal e dever ser evitada nesses subgrupos de alto risco, se existirem alternativas. Uma dose mais elevada de levofloxacino e, talvez, uma dose elevada de IBP pode alcançar um maior sucesso de erradicação. O moxifloxacino, uma quinolona relacionada, também foi utilizada, mas é menos estudada e tem um espectro de atividade mais amplo; portanto, o levofloxacino é geralmente preferido.
Existem outros tratamentos que, embora menos estudados, foram recomendados em várias revisões. A furazolidona, por exemplo, tem sido utilizada em lugares com alta RC e RL, mas os dados de qualidade que atestam o seu valor são escassos em comparação com as terapias estabelecidas, e seu papel exato permanece indefinido.
Quando se utiliza resistência antimicrobiana por cultura ou teste PCR rápido, o tratamento pode ser personalizado para cada paciente. Isto é susceptível de ter maior importância nas regiões com maior resistência primária, uma vez que evitaria a claritromicina na primeira linha. A validação e aceitação dos testes PCR nas fezes permitiria estender esse benefício à atenção primária e em circunstâncias em que a endoscopia não é necessária ou acessível.
As tabelas 6 e 7 fornecem uma visão geral e um resumo dos esquemas de tratamento de primeira linha e sua composição.
Terapias de segunda linha ou de resgate após falha na erradicação de primeira linha foram bem estudadas em alguns lugares, mas existe uma falta total de dados para muitas regiões com poucos recursos [4-12–12].
As terapias de segunda linha mais estudadas e utilizadas incluem terapia quádrupla padrão com bismuto por 7-14 dias e terapia tripla com levofloxacino por 10-14 dias, como descrito acima. Ambas demonstraram atingir taxas de erradicação superiores a 80%. A escolha entre as duas depende se as taxas locais de resistência primária ao levofloxacino, disponibilidade, experiência, adesão e custo são conhecidos. A terapia mais longa (isto é, 14 dias) é muito recomendada, mas faltam dados sobre os resultados locais, custos e adesão. Quando esses tratamentos falham, a outra terapia é a terceira escolha habitual. Em centros experientes, as taxas de erradicação total com terapias criteriosamente escolhidas após falha da primeira linha devem ser de 98% após até três tratamentos.
Outras terapias de resgate que foram utilizadas incluem terapia tripla à base de rifabutina (IBP-AR). Em geral, é menos eficaz e o risco de neutropenia grave pode chegar a 1%, o que limita seu uso. É normalmente evitada em regiões com alta prevalência de tuberculose. A dupla dose de IBP com amoxicilina (IBP-A) tem sido utilizada com algum sucesso. As terapias quádruplas sem bismuto costumam ser ineficazes como terapias de resgate devido à RC e RM secundária. Quando a sensibilidade ao metronidazol é conhecida após os testes, a IBP-AM pode ser utilizada como tratamento de segunda linha com resultados razoáveis, mas não é muito utilizada como terapia de segunda linha de forma empírica. A furazolidona foi utilizada e é recomendada como componente de terapia em algumas regiões. Existem poucos estudos de erradicação de alta qualidade que incluam esse fármaco, e os ensaios randomizados são muito raros. Devido a preocupações com sua segurança e utilização, não está disponível nos Estados Unidos e na União Europeia.
Em caso de insucesso, apesar de ter seguido as medidas adequadas, devem ser evitadas terapias ad hoc por bel-prazer do prescritor e a infecção em curso deve ser aceita, a menos que estejam disponíveis um subespecialista ou um ensaio clínico. Em alguns pacientes - como aqueles com úlcera recorrente - a falha na erradicação pode resultar na necessidade de terapia anti-secretora de manutenção
Para pacientes com alergia à penicilina, o metronidazol pode ser substituído pela amoxicilina e combinado com uma IBP e claritromicina (IBP-MC). No entanto, a RM primária reduz sua eficácia. A terapia quádrupla com bismuto é uma alternativa muito boa (IBP-BTM). Se ambas as terapias falharem, as opções restantes serão poucas. Nos pacientes com história no passado, incerta ou improvável de alergia à penicilina e SE os recursos estão disponíveis, é possível fazer uma avaliação formal da alergia à penicilina tipo 1. Consiste em medir os anticorpos antipenicilina, seguido de teste de punção cutânea e, se negativo, de teste de provocação oral supervisionada. Quando esta provocação é feita em pacientes de baixo risco, foi demonstrado que até 80% não são alérgicos à penicilina e podem receber terapias contendo amoxicilina, se necessário (normalmente IBP-AL ou IBP-AC se a claritromicina não foi utilizada inicialmente), sem riscos. A estratégia demonstrou uma erradicação bem-sucedida na maioria dos pacientes. Se houver uma história clara de uma reação do tipo 1, a alergia é assumida, e os testes não são indicados.
Em suma, nas regiões com bons recursos onde as taxas locais de RC e RM (e às vezes RL) são conhecidas, a escolha de tratamento baseado em evidências nas regiões com menor RC é geralmente IBP-CA como primeira linha, com terapias IBP-BTM ou IBP-AL como segunda e terceira linha, em qualquer ordem. Em regiões com níveis mais elevados de RC, o IBP-BTM pode ser usado. B+IBP-AC ou IBP-AL podem ser terapias alternativas de primeira linha. As opções da segunda linha dependem do que foi usado em primeiro lugar: IBP-BTM ou IBP-AL podem ser usados se não o foram anteriormente.
Em regiões com poucos recursos, onde RC e RM comunitárias são desconhecidas ou elevadas, a escolha da terapia é baseada em auditorias empíricas dos resultados, no histórico pessoal de exposição a antibióticos como monoterapia do paciente, nos níveis conhecidos de uso comunitário desses fármacos, na disponibilidade e no custo (Tabela 8). A IBP-AC ainda é a escolhida com IBP-BTM ou IBP-AL, também as terapias quádruplas sem bismuto como terapias alternativas de primeira linha ou de resgate. Contudo, se a terapia de primeira linha com claritromicina falhar, uma das outras terapias pode ser escolhida. Os dados sobre as taxas de RL são muito necessários, uma vez que parece ser comum em muitas regiões e a qualidade de alguns dados publicados é incerta. A terapia quádrupla IBP-BTM é uma boa primeira e subsequente escolha, porque evita o problema dos maus resultados devido à resistência. Contudo, seu uso é às vezes limitado pela disponibilidade, conformidade e efeitos adversos. Seja qual for a opção escolhida, é crucial não repetir a mesma terapia, pois a estratégia tem valor muito baixo após falhar na primeira linha, devido à resistência antimicrobiana secundária. A taxa de sucesso na erradicação com IBP-AC pode ser de 80% ou mais no tratamento de primeira linha, mas apenas 8% se a terapia for repetida após falha da primeira linha. A maior parte disso é atribuível à RC secundária. Infelizmente, essa prática é muito comum em alguns lugares, mas deve ser desencorajada. Finalmente, o acesso do paciente a medicamentos genéricos baratos e a educação médica continuam a ser desafios significativos em muitas regiões.
Uma via adequada para escolha da terapia é descrita na Fig. 4.
O estudo dos padrões de resistência da H. pylori para de definir a prevalência na população e suas alterações vai guiar as opções de tratamento. Em países com bons recursos, é possível adaptar a terapia conforme a sensibilidade antimicrobiana da biópsia endoscópica do indivíduo antes do tratamento. Contudo, essa não é a norma na prática clínica e, nos laboratórios menos especializados, a cultura e subcultura para testes de resistência ainda podem falhar. Além disso, muito tratamento ocorre no ambiente de atenção primária, onde se trabalha com testes e tratamentos não invasivos. Após o tratamento falhar, é pouco provável que os testes de sensibilidade antimicrobiana das culturas de biópsias tenham grande incidência nas decisões clínicas. Se foi usada claritromicina e falhou, a RC secundária é tão comum que torna inútil o teste e deve ser escolhida outra terapia. A avaliação da RM pode ser útil se existe a opção de usar IBP-AM, mas não influencia a escolha da IBP-BTM, uma vez que essa terapia não é afetada pela RM. O levofloxacino é usado empiricamente na maioria das regiões onde a prevalência de RL é baixa. Além disso, a sensibilidade in vitro da H. pylori a outros antibióticos não significa sucesso terapêutico e os regimes ad hoc não devem ser concebidos desta forma.
Se técnicas de biópsia molecular (ou fecal) baratas se tornarem mais disponíveis no local de atendimento para avaliação rápida da resistência, estas podem ter um grande impacto na seleção do tratamento e mudar a prática. Esses testes podem substituir os testes de urease, confirmando a presença de infecção e fornecendo informação rápida sobre resistência antimicrobiana para orientar uma terapia individualizada, a um custo apenas ligeiramente superior aos atuais testes comerciais para urease. Os testes fecais permitiriam adaptar o tratamento segundo a sensibilidade antimicrobiana de cada paciente na atenção primária, sem necessidade de endoscopia.
Seja qual for a terapia indicada, todo esforço deve ser feito para maximizar a adesão. Isso significa que o profissional da saúde deve dedicar tempo para explicar ao paciente a importância de respeitar as instruções e não interromper o tratamento. Isto é essencial nas regiões onde a regulamentação relativa ao uso de antibióticos pode ser pouco rigorosa ou não aplicada, e onde os antibióticos são obtidos sem receita nas farmácias. Os pacientes podem comprar medicamentos em pequenas quantidades durante um ou dois dias, com risco de não persistência se os sintomas não forem aliviados imediatamente ou se ocorrer algum efeito adverso. Claramente, todo o curso da terapia deve ser prescrito e dispensado logo no início. Os efeitos adversos incômodos – como alteração temporária do paladar, comum à claritromicina e ao metronidazol - devem ser antecipados e explicados para que a sua ocorrência não conduza à cessação da terapia. A estratégia de fornecer material de apoio e informações sobre a dosagem provou ser útil. Como é sabido, fumar é um fator preditivo adverso para o resultado, parar de fumar antes e durante a terapia pode melhorar os resultados, embora isso não tenha sido bem estudado. Parar de fumar também ajuda a curar as úlceras. Foi alegado que os probióticos ajudam a reduzir os efeitos adversos (e, possivelmente, a melhorar os resultados), mas são necessários mais e melhores testes para substanciar isso.
Boas práticas
Os pacientes devem ser sempre avisados de que o sucesso da erradicação depende da adesão ao tratamento. Deve-se dedicar tempo para aconselhar o paciente, explicando como tomar os medicamentos e antecipando os efeitos colaterais adversos. A necessidade de encerrar o tratamento deve ser enfatizada. Informação escrita ou pictórica pode ajudar à adesão.
Seria ideal avaliar os resultados em todos os pacientes tratados, embora na prática isso seja possível em muitos lugares. Quando a endoscopia foi realizada inicialmente e foi identificada atrofia gástrica e/ou metaplasia intestinal, é necessário decidir sobre a vigilância endoscópica da mucosa [27]. Isto pode beneficiar os pacientes individuais, mas uma redução global da mortalidade devida ao câncer gástrico tem ainda de ser claramente demonstrada. Quando é encontrada displasia focal de alto grau na mucosa gástrica, as áreas podem ser removidas endoscopicamente, mas uma neoplasia mais avançada requer cirurgia. A displasia pode ser detectada usando imagens aprimoradas ou mapeando amostras de biópsia sem lesões discretas endoscopicamente visíveis. Esses pacientes requerem reavaliação endoscópica, de preferência com endoscopia de imagem aprimorada e magnificação, no prazo de 6 meses para displasia de alto grau e 12 meses para displasia de baixo grau.
Como a atrofia e a metaplasia intestinal são frequentes, a vigilância endoscópica consumirá recursos endoscópicos consideráveis e terá um custo de oportunidade frente a outras necessidades de saúde. Por isso, normalmente só se oferece vigilância aos indivíduos de maior risco. O alto risco geralmente envolve a presença de alterações mais extensas da mucosa gástrica (envolvendo antro e corpo do estômago) e/ou história familiar de câncer gástrico. A estratégia ideal ainda não foi determinada. A detecção endoscópica exata e a caracterização das alterações da mucosa requerem uma formação específica e endoscópios modernos, bem como patologistas qualificados.
Foram relatadas baixas taxas de resistência à claritromicina (6-8%) e altas taxas de resistência ao metronidazol (45-50%). Os dados sobre o levofloxacino são escassos, mas a resistência primária parece ser muito baixa, com a possível exceção das taxas dos imigrantes de regiões de alta resistência. Como resultado, a terapia tripla padrão com IBP, amoxicilina e claritromicina continua a ser a terapia de primeira linha recomendada, a menos e até que surjam evidências de aumento da RC. As taxas de erradicação relatadas aos 7 dias são de 80-87%. A terapia de 14 dias não foi estudada formalmente. As terapias de resgate incluem terapia tripla com levofloxacino por 10 dias (taxa de erradicação de 80-90%) e terapia quádrupla em dose padrão (IBP, bismuto, tetraciclina e metronidazol) por 7-14 dias, com resultados similares. Levofloxacino, tetraciclina e bismuto não são registrados localmente, pelo que não são frequentemente usados na terapia de primeira linha. Esses medicamentos devem ser obtidos no exterior, por meio de um esquema de acesso especial ou em farmácias magistrais, quando necessário para tratamento de resgate. A terapia tripla com rifabutina tem sido utilizada com menos frequência (76% de erradicação). As terapias concomitantes não foram estudadas a nível local.
Os dados sobre a resistência local estão faltando e existem poucos dados sistemáticos para avaliar o resultado da terapia. Portanto, a escolha da terapia é geralmente extrapolada de diretrizes internacionais e determinada pela disponibilidade de fármacos. É comum a escolha da terapia tripla com claritromicina, com IBP e amoxicilina ou metronidazol, apesar da suspeita clínica de RM elevada que afeta a eficácia desta última. Custo, disponibilidade, perícia local e adesão à terapia são todos obstáculos para um tratamento eficaz. Não existem dados auditados sobre terapia de resgate. Terapias ad hoc e repetir terapia com claritromicina após falha da primeira linha são desencorajadas.
Há fortes evidências de que a resistência à amoxicilina e à tetraciclina é baixa e estável (<5%), mas a RM é geralmente alta (30-100%). A RM tem aumentado, mas varia muito nos países do Sudeste Asiático (entre 2% e 43%). Para a maioria dos regimes, deve ser aplicada uma duração de 14 dias, a menos que haja evidências locais de taxas de erradicação confiáveis com uma duração mais curta. Idealmente, os regimes de primeira linha devem ser considerados com base nas taxas locais de resistência antimicrobiana, devido à ampla gama de resistência entre países. Taxas uniformes > 90% foram relatadas para IBP-BTM. Os regimes de segunda linha devem conter antibióticos não utilizados anteriormente, ou aqueles contra os quais é pouco provável desenvolver resistência, como amoxicilina ou tetraciclina. O IBP-BTM deve ser considerado, caso ainda não tenha sido utilizado. A rifabutina não deve ser considerada em regiões com alta prevalência de Mycobacterium tuberculosis. Se a terapia de erradicação falhar após uma segunda tentativa, o teste de sensibilidade aos antibióticos deve ser considerado.
Segundo um estudo piloto, a prevalência da soropositividade para H. pylori em adultos saudáveis na Armênia é de 41,5%; aumenta com a idade (13,6% no grupo etário 18-25 anos e 83,3% em maiores de 65 anos). A taxa de RC em 2018 foi de 3,6% e às fluoroquinolonas de 12,8%. Contudo, são necessários mais estudos, especialmente durante a pandemia de COVID-19, quando houve um aumento sem precedentes de prescrições de macrolídeos e fluoroquinolonas para infecções respiratórias pelos prestadores de atenção primária no país. A tetraciclina está disponível em comprimidos de 100mg, tornando o regime quádruplo convencional muito inconveniente. As recomendações locais adaptadas das diretrizes de Maastricht propõem a terapia tripla com claritromicina de 14 dias como terapia de primeira linha e a terapia quádrupla com bismuto modificado (IBP, bismuto, amoxicilina e metronidazol) como alternativa. As opções de segunda linha incluem terapia tripla ou quádrupla com levofloxacino. A eficácia de qualquer um dos regimes de erradicação não foi estudada a nível local.
A RC é muito importante para escolher o tratamento de primeira linha. Isto varia entre e dentro dos países europeus. Portanto, o monitoramento da resistência antimicrobiana é ainda essencial a nível da população. Dados recentes do registro europeu de >30.000 pacientes de 27 países [28], indicam taxas de resistência pré-tratamento de 22% para claritromicina, 32% para metronidazol e 13% de resistência dupla. Existe uma dicotomia, com RC inferior na Europa Central e do Norte; na Alemanha, a RC primária ainda está por baixo do nível de corte de 15%. A terapia tripla com amoxicilina e claritromicina por 14 dias segue eficaz nessas condições e é comumente usada como tratamento de primeira linha. Em áreas onde a RC primária é >15%, a terapia quádrupla com bismuto por 10 dias (ou 14 dias se os componentes forem administrados individualmente) é recomendada como terapia de primeira linha. A terapia concomitante que inclui três antibióticos em vez dos dois usados na terapia quádrupla com bismuto não é popular na maioria dos países. Na terapia tripla com IBPs, o uso de metronidazol foi amplamente abandonado e agora está reservado para casos individuais (por exemplo, em casos de alergia à amoxicilina ou de sensibilidade demonstrada ao metronidazol).
O aumento da resistência ao levofloxacino excluiu este antibiótico como componente dos regimes de primeira linha. Seu uso é cada vez mais preocupante, mesmo na segunda linha. A rifabutina é eficaz no tratamento de terceira linha e é recomendada como componente de um regime de resgate após falhas repetidas do tratamento.
As recomendações europeias destacam a importância dos testes (TRU-C13) para avaliar a resposta individual ao tratamento. Os testes de resistência antimicrobiana comumente usados são incentivados após falhas no tratamento.
O aumento da resistência antimicrobiana é o problema principal. A sensibilidade antimicrobiana deve ser confirmada antes do início do tratamento de primeira linha com claritromicina, mas atualmente não é viável para a maioria dos pacientes. Portanto, a escolha do tratamento é baseada na prevalência local de RC. Contudo, essa informação está faltando na maioria das regiões da Itália; uma alta prevalência (30%) foi relatada em algumas regiões centro e sul. A terapia quádrupla com bismuto de 10 ou 14 dias ou terapia quádrupla concomitante sem bismuto é recomendada como tratamento de primeira linha quando a RC é >15% ou desconhecida. A eficácia desses dois regimes não é afetada por RC ou RM, e a terapia quádrupla baseada em bismuto funciona bem quando há resistência dupla. Assim, na Itália, a terapia quádrupla com bismuto pode ser considerada a melhor opção para o tratamento empírico de primeira linha.
A terapia tripla padrão, ou seja, IBP mais claritromicina e amoxicilina ou mais metronidazol/tinidazol, é eficaz em cepas sensíveis à claritromicina, mas falha quando a RC está presente. A terapia tripla padrão de 14 dias deve ser usada como terapia de primeira linha apenas em áreas com baixa prevalência conhecida de RC (<15%), em pacientes sem uso prévio de macrolídeos ou em áreas onde este regime demonstrou atingir altas taxas de erradicação.
A terapia sequencial, com IBP mais amoxicilina por 5-7 dias, seguido por IBP mais metronidazol e claritromicina por 5-7 dias, foi concebido para superar o problema da resistência à claritromicina. Contudo, os dados sobre sua eficácia são contraditórios. Diretrizes recentes têm desencorajado seu uso, apesar de alguns relatos da Itália sobre taxas de erradicação de cerca de 90%, mesmo com RC. Os tratamentos de segunda linha incluem terapia tripla com levofloxacino e terapia quádrupla com bismuto. Suplementos de probióticos podem ser usados para reduzir os efeitos adversos dos antibióticos.
A América do Norte tem uma resistência variável à claritromicina (17-32% em diferentes estudos) e uma elevada resistência ao metronidazol (44%). A resistência à amoxicilina foi de 6% em um estudo recente, e a resistência à rifabutina foi de 0%. As diretrizes dos EUA recomendam que, para o tratamento de primeira linha, a terapia tripla com claritromicina seja limitada a pacientes sem histórico de exposição a macrolídeos que moram em áreas onde a resistência à claritromicina contra H. pylori é baixa. Algumas áreas suburbanas e rurais do país satisfazem esses critérios. A terapia quádrupla com bismuto ou terapia concomitante com IBP, claritromicina, amoxicilina e metronidazol é recomendada como terapia de primeira linha na maioria das áreas. Uma combinação de rifabutina, amoxicilina e omeprazol foi aprovada para tratamento da H. pylori nos Estados Unidos. Seu papel na terapia inicial ainda não foi determinado.
Os estudos sobre a RC na América do Sul e Central permanecem escassos, com algumas taxas já relatadas acima de 20%. As prevalências mais altas são descritas no México, Colômbia, Argentina e Brasil. O uso indiscriminado de azitromicina (um medicamento de baixo custo) pode selecionar mutantes resistentes aos macrolídeos e agravar as taxas de RC. Baixas taxas de resistência à amoxicilina foram documentadas, mas alguns estudos mostram que seu percentual é alto no Brasil. Se essa tendência se confirmar, seria uma situação alarmante, devido ao papel central desses antibióticos.
A terapia tripla clássica com IBP, amoxicilina e claritromicina por 7 a 14 dias é ainda o mais utilizado, seguido pela terapia quádrupla com bismuto como alternativa ou terapia de segunda linha e a terapia à base de levofloxacino como opção de resgate. A resistência ao levofloxacino é baixa, mas níveis elevados foram relatados no Peru. O uso associado de metronidazol é comum para a terapia quádrupla de primeira linha, mas a prevalência de resistência relatada é superior a 50% na América Central, México e em alguns países da América do Sul, como Brasil e Colômbia.
Taxas de recorrência maiores de 3-5% ao ano, com variabilidade geográfica, foram relatadas; faltam dados de muitas regiões. Os obstáculos a serem superados incluem o custo do medicamento, a falta de adesão às diretrizes pelos médicos, a falta de TRs em muitas regiões, a indisponibilidade de sais de bismuto, furazolidona e rifabutina em alguns países e a falta de estudos locais de alta qualidade para validar regimes anti H. pylori. A maioria dos sistemas de saúde da região ainda está a funcionar de forma subutilizada nessas questões.
1. Hooi JKY, Lai WY, Ng WK, Suen MMY, Underwood FE, Tanyingoh D, et al. Global prevalence of Helicobacter pylori infection: systematic review and meta-analysis. Gastroenterology. 2017 Aug 1;153(2):420–9.
2. Kusters JG, van Vliet AHM, Kuipers EJ. Pathogenesis of Helicobacter pylori infection. Clin Microbiol Rev. 2006 Jul;19(3):449–90.
3. Chmiela M, Kupcinskas J. Review: pathogenesis of Helicobacter pylori infection. Helicobacter. 2019 Sep;24 Suppl 1:e12638.
4. Fock KM, Katelaris P, Sugano K, Ang TL, Hunt R, Talley NJ, et al. Second Asia-Pacific consensus guidelines for Helicobacter pylori infection. J Gastroenterol Hepatol. 2009 Oct;24(10):1587–600.
5. Mahachai V, Vilaichone R-K, Pittayanon R, Rojborwonwitaya J, Leelakusolvong S, Maneerattanaporn M, et al. Helicobacter pylori management in ASEAN: the Bangkok consensus report. J Gastroenterol Hepatol. 2018 Jan;33(1):37–56.
6. Malfertheiner P, Megraud F, O’Morain CA, Gisbert JP, Kuipers EJ, Axon AT, et al. Management of Helicobacter pylori infection—the Maastricht V/Florence Consensus Report. Gut. 2017;66(1):6–30.
7. Coelho LGV, Marinho JR, Genta R, Ribeiro LT, Passos M do CF, Zaterka S, et al. IVth Brazilian consensus conference on Helicobacter pylori infection. Arq Gastroenterol [Internet]. 2018 Apr 16 [cited 2018 May 10]; Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-28032018005001101&lng=en&tlng=en
8. Fallone CA, Chiba N, van Zanten SV, Fischbach L, Gisbert JP, Hunt RH, et al. The Toronto consensus for the treatment of Helicobacter pylori infection in adults. Gastroenterology. 2016 Jul;151(1):51-69.e14.
9. Mitchell H, Katelaris P. Epidemiology, clinical impacts and current clinical management of Helicobacter pylori infection. Med J Aust. 2016 Jun 6;204(10):376–80.
10. Chey WD, Leontiadis GI, Howden CW, Moss SF. ACG clinical guideline: treatment of Helicobacter pylori infection. Am J Gastroenterol. 2017 Feb;112(2):212–39.
11. Sugano K, Tack J, Kuipers EJ, Graham DY, El-Omar EM, Miura S, et al. Kyoto global consensus report on Helicobacter pylori gastritis. Gut. 2015 Sep;64(9):1353–67.
12. Liu WZ, Xie Y, Lu H, Cheng H, Zeng ZR, Zhou LY, et al. Fifth Chinese National Consensus Report on the management of Helicobacter pylori infection. Helicobacter. 2018 Apr;23(2):e12475.
13. Goh K-L. Lessons learnt from the epidemiology of Helicobacter pylori infection in Malaysia: JGHF Marshall and Warren Lecture 2017. J Gastroenterol Hepatol. 2018 Jun;33(6):1177–84.
14. Warren JR, Marshall B. Unidentified curved bacilli on gastric epithelium in active chronic gastritis. Lancet Lond Engl. 1983;1(8336):1273–5.
15. World Health Organization. Cancer [Internet]. [cited 2021 Feb 20]. Available from: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cancer
16. Ford AC, Yuan Y, Forman D, Hunt R, Moayyedi P. Helicobacter pylori eradication for the prevention of gastric neoplasia. Cochrane Database Syst Rev. 2020 Jul 6;7:CD005583.
17. Lazebnik LB, Bordin DS, Mikheeva OM, Belousova NL. [Eradication efficiency and Helicobacter pylori resistance to antibiotics in anticipation of IV TH Maastricht consensus issues publication. Editorial]. Exp Clin Gastroenterol. 2011;8:3–7.
18. Rugge M, Meggio A, Pennelli G, Piscioli F, Giacomelli L, De Pretis G, et al. Gastritis staging in clinical practice: the OLGA staging system. Gut. 2007 May;56(5):631–6.
19. Katelaris PH, Lowe DG, Norbu P, Farthing MJ. Field evaluation of a rapid, simple and inexpensive urease test for the detection of Helicobacter pylori. J Gastroenterol Hepatol. 1992 Dec;7(6):569–71.
20. Li Y, Lv T, He C, Wang H, Cram DS, Zhou L, et al. Evaluation of multiplex ARMS-PCR for detection of Helicobacter pylori mutations conferring resistance to clarithromycin and levofloxacin. Gut Pathog. 2020;12:35.
21. Pichon M, Pichard B, Barrioz T, Plouzeau C, Croquet V, Fotsing G, et al. Diagnostic accuracy of a noninvasive test for detection of Helicobacter pylori and resistance to clarithromycin in stool by the Amplidiag H. pylori+clarir real-time PCR assay. J Clin Microbiol. 2020 Mar 25;58(4).
22. Jehanne Q, Bénéjat L, Mégraud F, Bessède E, Lehours P. Evaluation of the AllplexTM H pylori and ClariR PCR assay for Helicobacter pylori detection on gastric biopsies. Helicobacter. 2020 Aug;25(4):e12702.
23. Savoldi A, Carrara E, Graham DY, Conti M, Tacconelli E. Prevalence of antibiotic resistance in Helicobacter pylori: a systematic review and meta-analysis in World Health Organization regions. Gastroenterology. 2018 Nov 1;155(5):1372-1382.e17.
24. Vilaichone RK, Quach DT, Yamaoka Y, Sugano K, Mahachai V. Prevalence and pattern of antibiotic resistant strains of Helicobacter pylori infection in ASEAN. Asian Pac J Cancer Prev. 2018 May 26;19(5):1411–3.
25. Kiyotoki S, Nishikawa J, Sakaida I. Efficacy of vonoprazan for Helicobacter pylori eradication. Intern Med Tokyo Jpn. 2020 Jan 15;59(2):153–61.
26. McNicholl AG, Bordin DS, Lucendo A, Fadeenko G, Fernandez MC, Voynovan I, et al. Combination of bismuth and standard triple therapy eradicates Helicobacter pylori infection in more than 90% of patients. Clin Gastroenterol Hepatol. 2020 Jan;18(1):89–98.
27. Dinis-Ribeiro M, Areia M, de Vries AC, Marcos-Pinto R, Monteiro-Soares M, O’Connor A, et al. Management of precancerous conditions and lesions in the stomach (MAPS): guideline from the European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE), European Helicobacter Study Group (EHSG), European Society of Pathology (ESP), and the Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva (SPED). Endoscopy. 2012 Jan;44(1):74–94.
28. Nyssen OP, Bordin D, Tepes B, Pérez-Aisa Á, Vaira D, Caldas M, et al. European Registry on Helicobacter pylori management (Hp-EuReg): patterns and trends in first-line empirical eradication prescription and outcomes of 5 years and 21 533 patients. Gut. 2021 Jan;70(1):40–54.